Fort VII e as câmaras de gás nazistas

Ditados e frases feitas não fazem muito o meu tipo, mas tem uma que diz que "a única maneira de virar uma página é lendo-a por completo". Nessa frase eu acredito bastante e nós lemos uma página muito complicada da história humana durante a nossa viagem a Poznan, na Polônia: o exato lugar onde foram realizados os primeiros experimentos com câmaras de gás pelos nazistas.

A essa altura você já deve saber que estivemos em Poznan com nossos amigos do Fotostrasse. E como eles já conheciam a cidade, disseram pra gente visitar um antigo campo de concentração chamado Fort VII. Ao contrário do que foi nosso divertido encontro com os bodes de Poznan, fomos advertidos que essa visita seria bem pesada, porém obrigatória pra entender uma parte da história que não pode ser esquecida ou deixada de lado.

E lá fomos nós.

Foi a primeira vez que estivemos em um campo de concentração. Nada relativo ao Fort VII é tranquilo e nós descobrimos isso logo na chegada. Assim que passamos os muros que cercam a construção, demos de cara com o portão principal, que traz o nome usado durante o período de dominação nazista (Konzentrationslager Posen) e o temido SS, símbolo da Polícia Nazista.

Esse símbolo é proibido em vários países europeus e só pode ser exibido com os propósitos de arte, ciência, pesquisa ou ensinamento. Mesmo sendo o caso do Fort VII, é chocante ficar cara a cara com um SS original da Segunda Guerra.

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

 

A história

O Fort VII é um dos 18 fortes construídos entre 1876 e 1880, época em que Poznan ficava no Reino da Prússia e era uma parte importante do mecanismo de defesa da cidade, especialmente durante a Primeira Guerra Mundial. Com o fim dessa Guerra, em 1918, o lugar foi readequado e serviu como depósito de artefatos militares.

A grande mudança aconteceu mesmo setembro de 1939, quando a ocupação nazista chegou até a cidade. Levando em conta a arquitetura (muros altos e largos), a localização (fácil acesso a partir do centro de Poznan) e o fato da construção ser cercada por uma densa vegetação (o que contribuía para a camuflar as atividades realizadas lá dentro), as autoridades alemãs decidiram que o Fort VII seria o primeiro campo de concentração no território da Polônia.

E essa parte é um detalhe MUITO importante. O nosso guia nos disse, repetidas vezes, pra que jamais nos referíssemos ao Fort VII como um campo de concentração polonês. O que ele era, na verdade, era um campo de concentração alemão dentro da Polônia. É com toda razão que o povo polonês faz questão de deixar isso bem claro para que ninguém confunda as coisas!

Documentos oficiais diziam que o Fort VII era uma prisão para civis, mas isso se mostrou apenas uma fachada. Na realidade, o lugar funcionou por vários anos como um campo de extermínio de cidadãos poloneses. Em abril de 1944, documentos apontavam que mais de 18 mil pessoas haviam passado pelo confinamento na área do forte sob a supervisão de 400 membros da SS.

Com o fim da Segunda Guerra e a derrota dos nazistas, o Fort VII foi devolvido ao exército polonês e novamente foi usado como um simples depósito. Até que em 1976, ele foi aberto ao público como um museu e passou a se chamar oficialmente Museum for Wielkopolska Martyrs - Fort VII

Hoje é possível ver uma grande quantidade de memorabilia original da época da ocupação. Documentos do exército nazista, roupas, fotos, cartas e pertences dos prisioneiros, além de vários objetos que eram usados nas atividades diárias do campo de concentração.

 

A invenção das câmaras de gás

Campos de concentração existiram aos montes durante o Terceiro Reich e o Fort VII era infinitamente menor e menos representativo do que Auschwitz ou Sachsenhausen, por exemplo. Mas a história também reservou um capítulo macabro pra esse lugar.

Ainda em 1939, no começo das atividades do campo, a SS estava procurando maneiras mais "eficazes" de matar prisioneiros em massa.

Nosso guia disse que o fuzilamento dos presos se mostrou problemático em termos de logística:  havia o gasto das balas, o tempo que os soldados levariam para realizar as execuções e a possibilidade de se criar uma agitação entre os "próximos do paredão", algo que os nazistas queriam evitar a qualquer custo. Resumindo: eles queriam eliminar mais gente em menos tempo e com menos trabalho.

Outra tentativa foi, acredite se quiser, a guilhotina. Os caras acharam que conseguiriam cortar milhares de cabeças, mas desistiram rapidamente porque a organização disso se mostrou muito complicada. Ah, a guilhotina está lá exposta.

Depois desses dois fracassos, veio a ideia das câmaras de gás. Os testes foram feitos em doentes mentais internados num hospital psiquiátrico de Poznan. Cerca de 400 deles foram levados para a ala hospitalar do Fort VII e submetidos às sessões com o gás que saía do chuveiro.

Pronto. Não havia barulho, não havia sangue, não havia como os outros prisioneiros saberem o que estava acontecendo na sala ao lado. Foram esses os primeiros a serem exterminados com essa técnica doentia dos nazistas.

Estivemos nessa ala hospitalar, vimos os cilindros de gás e os chuveiros onde tudo aconteceu e obviamente não dá pra descrever o tamanho do mal-estar e o peso que um lugar desses carrega. É pesado, amigos.

Em alguns tijolos dá pra ver marcas de unha, de gente tentando fugir enquanto sabia que estava ali pra morrer. Esses tijolos estão em destaque na parede, porque os historiadores fazem questão de nos mostrar do que o ser humano já foi capaz de fazer.

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

 

A escada da morte

Apesar do tamanho bem inferior aos outros campos, o Fort VII adquiriu a fama de ser um dos lugares mais cruéis sob o controle dos nazistas.

Não bastasse ter sido o palco da criação das câmaras de gás, outras práticas terríveis eram executadas por lá. Muito disso se deve à alta relação de guardas para cada preso. A média era 1 oficial da SS para cada 5 prisioneiros, número muito superior aos outros campos.

Por conta disso, havia espaço para que os guardas inventassem todo tipo de atrocidade. As celas das mulheres, por exemplo, ficavam um nível abaixo das celas masculinas, eram escuras e inundadas pela água até a altura da cintura e elas eram obrigadas a passar o dia, incluindo dormir, nessas condições.

O acesso à higiene pessoal inexistente levava à rápida proliferação de doenças. As epidemias eram constantes e matavam os detentos em grande quantidade.

Mas, em termos de crueldade, nada supera a "escada da morte". Essa prática consistia em convencer um preso a subir uma escada íngreme carregando uma pedra pesadíssima. A ele era prometido que se conseguisse chegar lá em cima, seria libertado.

Óbvio que era mentira. O que acontecia na verdade era que, depois de todo o esforço físico da subida, o prisioneiro era chutado escada abaixo, com a pedra junto. E nisso morria esmagado.

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Fort VII e as câmaras de gás

Já perto do final da Segunda Guerra, a SS começou a destruir provas, documentos e registros do que aconteceu dentro do Fort VII. Isso faz com que as estimativas de quanta gente morreu lá dentro sejam muito imprecisas.

Tem gente que diz que foram 4.000 mortos e tem gente que diz que foram 100.000. Nosso guia disse que entre mortos, feridos, mutilados e gente que teve parentes em alguma dessas situações, mais de 450.000 pessoas foram afetadas diretamente pela existência desse campo de concentração.

Poznan tem hoje cerca de 500.000 habitantes, então é uma loucura imaginar que essa mesma quantidade de pessoas sofreu na mão da SS há mais de 70 anos.

Visitar um lugar desses não é agradável. É pesado, é tenso, dá calafrios, dá uma sensação ruim em várias partes do corpo. 

Mas é importante e até necessário. Um amigo que visitou Auschwitz me disse que se todo ser humano fosse obrigado a visitar um campo de concentração, talvez não estivéssemos assistindo a tanta maluquice hoje em dia.

Porque, para virar uma página, você precisa lê-la inteira.

Nossos sentimentos para todos que, de uma forma ou outra, sofreram com o que aconteceu no Fort VII!

O Viagem Criativa viajou para Poznan com apoio da EasySim4U e do Visit Poznan! Todas as opiniões expressadas aqui são nossas!

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